sexta-feira, 12 de junho de 2015

EUA, Alemanha e Reino Unido limitam concentração da mídia

#Assina1

Escrito por: Elizângela Araújo/Fotos: Antônio Augusto, Câmara dos Deputados

Comparando o cenário nacional ao de outras democracias do mundo, estamos décadas atrasados no debate sobre o estabelecimento de limites à propriedade e controle das empresas de mídia

Os projetos de lei 4.026/04 e 6667/09, debatidos em audiência pública sobre limites à concentração econômica dos meios de comunicação na Câmara dos Deputados, nesta quinta (11/6), regulamentam o Art. 220 da Constituição Federal. O dispositivo constitucional estabelece que é livre a manifestação de pensamento, a criação, a expressão e a informação, especificando, em seu Parágrafo 5º, que os meios de comunicação não podem ser objeto de monopólio ou oliogopólio, direta ou indiretamente.
 
Comparando o cenário nacional ao de outras democracias do mundo, estamos décadas atrasados no debate sobre o estabelecimento de limites à propriedade e controle das empresas de mídia. Estados Unidos, Alemanha e Reino Unido, por exemplo, possuem mecanismos legais que impedem o que hoje acontece no Brasil: uma concentração brutal do mercado de radiodifusão.
 
Estados Unidos
 
A regulação do setor de comunicação nos Estados Unidos, berço do Liberalismo, obriga a Comissão Federal de Comunicações (FCC, por sua sigla em inglês), órgão regulador do mercado, a rever as regras relativas à concentração econômica no setor a cada quatro anos. Lá, um mesmo grupo não pode deter mais que 39% da audiência dos domicílios. Além disso, estão proibidas fusões entre as quatro principais redes: ABC, CBS, Fox e NBC. O país não permite a propriedade cruzada como temos no Brasil. "Ela é permitida apenas no caso de emissoras locais, porém, com limites que variam conforme o número total de emissoras independentes existentes no mercado local. "Quanto mais estações, maior é o número de emissoras que podem pertencer a um mesmo grupo", complementa Octávio Pieranti, assessor da Secretaria Executiva do Ministério das Comunicações (MiniCom).
 
Pieranti apresentou um quadro comparativo para contextualizar os projetos em discussão pela Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática (CCTCI) nos contextos nacional e Internacional. "Obviamente não estamos propondo a simples cópia de leis internacionais para o Brasil, mas é importante contextualizar a discussão para subsidiar o avanço que precisamos fazer no nosso sistema", observou.
 
ReinUnido
 
No Reino Unido, o Ofcom, que é o órgão regulador do setor de comunicações, também precisa rever as regras periodicamente, a cada três anos. Na revisão de 2009, embora tenha removido os limites estabelecidos para o total de outorgas de emissoras de rádio locais controladas por um mesmo grupo, o Ofcom manteve regra que permite ao secretário de Estado (ministro) vetar fusões de empresas de mídia. No mesmo ano, o órgão também permitiu a propriedade cruzada, em nível local, desde que um grupo não disponha de um jornal local com mais de 50% do mercado potencial ao mesmo tempo que detenha emissoras de rádio e TV retransmissoras do Canal 3 (principal canal de TV privado do país); por outro lado, manteve impedimento de propriedade cruzada entre o Canal 3 e jornais nacionais, e a separação entre as fontes de financiamento do Canal 3 e da BBC.
 
A regulação do setor de comunicação do Reino Unido também veta licença de retransmissão do Canal 3 a empresas que controlem um jornal nacional com mais de 20% do mercado. Essas empresas também não podem deter participação superior a 20% em outorga destinada a retransmiti-lo.
 
Alemanha
 
Outro país que impõe limites à concentração da propriedade de empresas de mídia é a Alemanha. De acordo com as informações prestadas pelo representante do MiniCom, caso um grupo econômico tenha posição dominante no mercado não pode receber nova licença nem adquirir parte de outra. Além disso, essas emissoras devem veicular mais programação independente e instalar um comitê de assessoramento que permita traçar políticas públicas de garantia do pluralismo. A posição dominante é caracterizada se todos os meios de comunicação da mesma empresa, considerando todas as suas participações, têm audiência anual de 30% do público ou 25% em um mercado relevante.
 
Para o assessor do MiniCom, a face mais evidente dessas normas internacionais é a tentativa de garantir o pluralismo, de viabilizar à sociedade acesso ao maior número de meios de comunicação. A menos evidente, embora não menos importante, é estimular a competição, permitir que a segunda, terceira ou quarta redes possam não só ter condições de sobrevivência como também expectativas de crescimento, “ou seja, criar um ambiente saudável, do ponto de vista econômico, para que essas empresas possam gerar empregos, movimentar a economia e desenvolver seu trabalho”.
 
Brasil
 
O Brasil, historicamente, expediu novas outorgas considerando apenas sua viabilidade técnica. O Ministério das Comunicações e os órgãos reguladores que o antecederam avaliavam se havia um canal disponível naquela cidade e outorgavam, ou não, de forma discricionária, a emissora.
 
Segundo Pieranti, não foram feitas análises sobre a capacidade dos mercados locais responsáveis por sediar as novas emissoras. Ou seja, determinado mercado é capaz de abarcar uma nova emissora comercial? O contexto local justifica uma nova emissora? Não se fazia essas análises. "Agora é que a gente começa a deflagrar um processo, muito vinculado a demanda do Tribunal de Contas da União (TCU), que tem a obrigação de enfocar aspectos econômicos no que se refere a novas outorgas."
 
CCTCI ainda não recolocou propostas em votação
 
Os projetos de lei 4.026/04 e 6667/09 ainda não têm data para voltar à pauta da Comissão de CCTCI. A recolocação das propostas na pauta da comissão é uma prerrogativa do presidente, deputado Fábio Sousa (PSDB-GO), que não participou da audiência pública. Por telefone, a secretaria da comissão informou que pelo menos na pauta da próxima reunião não foi incluída a apreciação das propostas.
 
Audiência pública
 
A audiência pública foi requerida pela deputada Luiza Erundina (PSB-SP) após o deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG), relator dos projetos de lei 4.026/04 e 6667/09, ter emitido parecer contrário à sua aprovação. Além de Pieranti, também participaram o FNDC, representado por Bia Barbosa; Ana Carolina Lopes de Carvalho, assessora da presidência do Cade; e Murilo César Ramos, coordenador do Laboratório de Políticas de Comunicação (LapCom) da Universidade de Brasília (UnB). A reunião foi presidida pelo deputado Jorge Tadeu Mudalen (DEM-SP).
 

quinta-feira, 11 de junho de 2015

Especialistas defendem limites à concentração econômica na mídia

Tema foi debatido em audiência pública na Câmara. “Um grupo só, as Organizações Globo, controla 70% do mercado brasileiro”, comentou a representante do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação, Bia Barbosa

Antonio Augusto/Câmara dos Deputados
Constituição já proíbe monopólio e oligopólio na mídia, mas Congresso não regulamentou artigo, lembrou Bia
Especialistas defenderam que o Congresso Nacional estabeleça limites à concentração econômica nos meios de comunicação social, em audiência pública na Comissão de Ciência e Tecnologia, Comunicação e Informática da Câmara dos Deputados nesta quinta-feira (11).
O colegiado discutiu o Projeto de Lei 4026/04, que determina que a operação de emissoras em rede não poderá alcançar audiência nacional superior a 50% dos lares, em qualquer horário.
Também foi debatido o PL 6667/09, apensado ao PL 4026/04, que proíbe a propriedade cruzada – ou seja, impede que uma concessionária de televisão tenha também uma rádio no mesmo município e vice-versa. Os projetos receberam parecer contrário do relator na comissão, deputado Paulo Abi-Ackel (PSDB-MG).
Monopólio
A secretária de Comunicação da Coordenação Executiva do Fórum Nacional pela Democratização da Comunicação (FNDC), Bia Barbosa, recomendou a aprovação dos projetos.
“A ausência de mecanismos de controle da formação de redes e da propriedade cruzada leva ao cenário de monopólio nas comunicações existente hoje no Brasil”, afirmou.
“Um grupo só, as Organizações Globo, controla 70% do mercado brasileiro”, complementou. Ela salientou ainda que a Constituição de 1988 já proíbe monopólios e oligopólios na comunicação, mas o artigo não foi regulamentado pelo Congresso.
A representante do FNDC também cobrou a implementação pelo Ministério das Comunicações e pelo Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) dos mecanismos antimonopólio já existentes na legislação.
O Decreto-Lei 236/67 estabelece limite de emissoras por localidade e por tipo de serviço prestado e proíbe a formação de cadeias, redes e conglomerados a partir de redes afiliadas.
“Esse é justamente um dos principais modos de concentração hoje no mercado de comunicação brasileiro”, explicou Bia. “O principal exemplo é a Rede Globo, que tem 117 emissoras afiliadas.”
Convergência
O professor Murilo César Ramos, coordenador do Laboratório de Políticas de Comunicação da Universidade de Brasília, defendeu que os “projetos prosperem na Casa, mas também que o Parlamento, além do Executivo, lance um olhar mais amplo sobre as comunicações”.
Ele acredita que a discussão sobre a concentração no setor deve levar em conta a convergência de mídias, incluindo radiodifusão, TV por assinatura e novas tecnologias.
Murilo defende um projeto amplo de regulação da mídia, atualizando o Código Brasileiro de Telecomunicações (Lei 4.117/62). “É preciso escapar dessa armadilha de que tratar desse assunto é tratar de censura”, destacou.
O anteprojeto chegou a ser discutido no governo Luiz Inácio Lula da Silva, mas nunca foi encaminhado ao Congresso. A presidente Dilma Rousseff também prometeu discutir novamente a matéria neste mandato.
Em seminário na Câmara, em maio, o presidente da Casa, Eduardo Cunha, disse que é contrário à regulação da mídia, afirmando que a regulação afeta a democracia.
Já a deputada Luciana Santos (PCdoB-PE) acredita que o controle da concentração de mídia garante a diversidade de expressão por parte da população. “Se a outorga de radiodifusão é uma concessão pública, tem que haver mecanismos de controle”, opinou.
Outros países
O assessor da Secretaria-Executiva do Ministério das Comunicações, Octávio Pieranti, disse que o ministério considera o debate fundamental. “Grande parte dos avanços na regulação do setor dependem de mudanças legislativas e este diálogo com o Congresso é muito importante”, afirmou.
Ele enfatizou que vários países do mundo limitam a concentração econômica no mercado de comunicação social, como Estados Unidos, Reino Unido e Alemanha, e que a avaliação do cenário internacional é uma forma de colher subsídios para o avanço da legislação brasileira.
Segundo Octávio, nos EUA e no Reino Unido, os órgãos reguladores do setor são obrigados a rever periodicamente, a cada três ou quatro anos, as regras referentes à concentração econômica. Ele destacou que, após quase 50 anos, o Decreto-lei 236/67 está desatualizado.
Para ele, a melhor forma de estabelecer novas regras seria a discussão de um novo modelo regulatório completo para o setor. “Estamos debatendo internamente neste momento, para depois avançar na discussão de medidas concretas do ponto de vista legislativo e, aí, regulamentar”, informou.
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