Julian Assange diz que mídia sonega informações por temer retaliação dos ‘donos do poder’
ASSANGE fala pela primeira vez a uma plateia brasileira, via teleconferência. O ativista está em prisão domiciliar há 267 dias após vazar no Wikileaks documentos do governo americano
SÃO PAULO. O ciberativista Julian Assange, fundador do Wikileaks — responsável pelo vazamento de milhares de telegramas produzidos por diplomatas do Departamento de Estado dos EUA ao redor do mundo — criticou as grandes organizações de mídia dos países ocidentais, em especial os jornais “The New York Times”, dos EUA, e “The Guardian”, da Inglaterra, por descumprirem acordos de divulgação dos segredos de Estado guardados pela organização, inclusive sonegando informações vitais por medo de retaliações dos governos e das empresas envolvidos nas denúncias.
De Norfolk, na Inglaterra, onde se encontra sob prisão domiciliar, Assange afirmou via teleconferência que o Wikileaks não divulga o nome de suas fontes em situações de risco (em que possam ser injustamente presas ou até mesmo assassinadas). Uma nota oficial publicada ontem no site da instituição acusa um jornalista do “Guardian” de ter “negligentemente” revelado a identidade das fontes em mais de 150 mil telegramas diplomáticos revelados recentemente. A organização acusa também uma pessoa na Alemanha de comercializar ilegalmente senhas de acesso exclusivo a este material.
— Desde que começamos a revelar os telegramas diplomáticos americanos, tivemos cuidado em preservar nossas fontes. E isso é tão verdade que não há até agora a notícia de que qualquer pessoa tenha sido presa ou morta por conta dos segredos revelados, com exceção da minha própria pessoa. — disse Assange, vestido num amarrotado terno branco, na abertura do InfoTrends, evento que termina hoje em São Paulo e discute tendências em tecnologia, internet e mobilidade.
Foi a primeira vez que Assange conversou com uma plateia brasileira e que falou publicamente desde que foi determinada a sua prisão domiciliar há oito meses. Afirmou que está há 267 dias preso sem que tenha feita nenhuma acusação formal contra ele e que isso é a maior prova de como os governos ocidentais manipulam as leis a seu favor.
— Toda vez que os governos da Europa e dos EUA são alvos de revelações sobre o que fazem à revelia das populações de seus países, eles buscam uma tática diversionista para tirar a atenção do que de fato interessa, que são as manipulações de seus sistemas legais — disse ele, sobre a polêmica envolvendo a revelação de nomes de fontes nos telegramas da Wikileaks. — O fato é que o governo americano tem uma lista com mais de 20 mil pessoas que foram ou serão assassinadas no Afeganistão ou no Iraque, e a grande mídia americana não diz nada.
Primavera Árabe teria
se originado com Wikileaks
Na palestra, Assange creditou à instituição o fenômeno da Primavera Árabe — os protestos populares que derrubaram e ainda derrubam governos no Norte da África e Oriente Médio:
— Ela aconteceu principalmente porque revelamos as ligações das ditaduras da região com o governo americano, como foi o caso da Tunísia, do Egito e da Arábia Saudita.
Governos estariam nas
mãos de criminosos
Assange afirmou que muitos governos ao redor do mundo estão tomados por criminosos e destacou que os cartéis do crime organizado formados no México avançam sobre governos e parlamentos da América Central e do Sul, como El Salvador. Ele afirma que boa parte do conteúdo dos telegramas do Departamento de Estado americano revelados há um ano diz respeito a esta tomada dos poderes legislativo e executivo dos governos por criminosos de todos os tipos (de traficantes a corruptos), mas as mídias locais não revelam os nomes de políticos ou empresas por medo de retaliações financeiras e processos na Justiça.
— Em muitos países, como no Brasil, nossos acordos foram respeitados, e as organizações trabalharam a favor das populações dos países. Mas em outros, como nos EUA e na Europa, jornais não tiveram a coragem de denunciar membros do governo ou empresas por medo de retaliações, já que estes grupos são os donos do poder. (Gilberto Scofield Jr.) |
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Jornal: O GLOBO | Autor: |
Editoria: Economia | Tamanho: 690 palavras |
Edição: 1 | Página: 30 |
Coluna: | Seção: |
Caderno: Primeiro Caderno | |
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