No topo da pirâmide, recuo pode estar relacionado à troca de computador por smartpho
Num puxadinho numa das entradas da Favela de Paraisópolis – a segunda maior de São Paulo – ficam José Francisco Rodrigues, de 51 anos, e seu computador de mesa conectado à internet. Pela rede ele paga contas, faz compras, acessa e-mail e define o preço dos tênis, bonés e camisetas esportivas que vende na Rodrigue's Sports.
“Se eu colocar um produto a um preço maior do que está na internet, perco o cliente”, diz ele, que no mês passado dobrou a velocidade da conexão – pelo triplo preço. Ultimamente, Rodrigues tem pensado em divulgar a loja pelas redes sociais. “A última ação de marketing que fiz foi com um carro de som”, lembra.
Quando o critério é o uso da internet, a pirâmide social brasileira tem se tornado cada vez menos desigual. Em 2011, a população com renda per capita de até 1 salário mínimo (R$ 678,00) – caso de Rodrigues – passou a representar 38% dos internautas do País, ante 32% em 2005, segundo estudo divulgado nesta quinta-feira (16) pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE).
O crescimento mais rápido, entretanto, ocorreu entre pessoas com o perfil como o Taísa Nascimento Carvalho, de 19 anos, – outra moradora de Paraisópolis –, que têm renda domiciliar per capita inferior a um quarto de salário mínimo, hoje R$ 169,50. Em 2005, apenas 3,8% dessa população havia usado a internet nos três meses anteriores à pesquisa. Em 2011, esse índice saltou para 21,4% – mais de 5 vezes mais (veja tabela).
Segundo Renato Meirelles, sócio-diretor do instituto Datapopular, na população mais jovem já não existe diferença entre ricos e pobres no acesso à internet.
“Nas classes C e D há um grau razoável de analfabetismo funcional, então os mais velhos acessam menos. Mas todos os que têm 14 anos são internautas, independentemente da renda”, diz Meirelles.
No conjunto da população, porém, o fosso ainda existe. Em média, 30% dos que têm renda domiciliar de até 1 salário mínimo per capita usa a internet, ante 46,5% da média brasileira. Já entre os que ganham de três a cinco salários mínimos, o índice sobe para 76%.
“Obviamente, comparado com os estratos mais altos, ainda é bem pequena [a utilização da internet entre os mais pobres]. Ainda existe uma associação entre acesso a internet e renda, mas a disseminação e o barateamento da tecnologia têm permitido que até mesmo pessoas com rendimento de até um quarto de salário mínimo usem a rede”, afirma Adriana Beringuy, técnica do IBGE.
Uso ‘cai’ entre mais ricos
Já entre os mais ricos, aponta o estudo do IBGE, o uso de internet teve um leve recuo nos últimos dois anos – um fenômeno inédito na história da pesquisa. Em 2011, 67,9% da população com renda familiar com mais de cinco salários mínimos per capita (R$ 3.390) usava internet, ligeiramente abaixo dos 68,3% de 2009.
Segundo Adriana, essa menor utilização tem relação com a idade. A população mais rica tende a ser de uma faixa etária mais elevada, que usa menos a internet. Há porém, uma outra hipótese: o abandono dos computadores em favor de tablets e smartphones, cujas conexões não são levadas em conta pelo IBGE. A supervisora de vendas Vanessa Montoza, de 37 anos, fez essa migração do computador para o dispositivo móvel na hora de navegar na internet em janeiro passado, quando ganhou seu primeiro celular inteligente.
“Dá desânimo de ligar o computador. Só uso para mexer em fotografias”, diz ela. “"O celular está ligado o tempo todo, envia notificações em tempo real e acaba sendo mais prático.”
A migração também tem ocorrido, entretanto, em franjas mais baixas e mais velhas. O professor João Ronaldo Soares, de 55 anos e com renda na casa dos cinco salários mínimos, ainda usa o netbook para preparar aulas. Mas sonha com o dia em que usará seu smartphone – seu único portal para o mundo on-line há seis meses – em rede com os dos alunos.
“O abandono do computador pelo smartphone foi inconsciente. O que me chamou a atenção foi a praticidade”, diz ele, que leciona na Legião Mirim de Bauru, cidade do interior paulista. “Gostaria de poder transformar o celular, que hoje é um inimigo do professor em sala de aula, em um aliado.”
Adriana, do IBGE, acredita que a população que aposentou os computadores seja minoria. A partir da PNAD 2013, essas pessoas também começarão a contar como usuários da internet.
“Hoje em dia é difícil pegar alguém que exclusivamente acesse a internet por smartphone. Não é que não exista. Existe e tende a crescer, mas ainda é grande o número de pessoas que acessam por todas as modalidades”, diz ela.
O crescimento do uso de internet móvel tem sido mais expressivo entre as classes mais baixas, afirma Leonardo Contrucci, diretor de Pré-Pago da Telefônica Vivo.
“[O público das classes C, D e E] só não usa hoje internet como classe A e B porque ainda é um serviço considerado caro e não tão essencial”, diz.
Taísa, a moradora de Paraisópolis, paga R$ 17 por mês para acessar a rede. É barato, mas sempre estoura a cota de dados. Mais um motivo para visitar a casa do namorado, onde aproveita uma conexão aberta de algum vizinho desavisado. “Ali fico horas”, diz.
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