Quanto às técnicas de comunicação saídas elas também das TIC (por exemplo, o telefone ou o correio eletrônico), estas não retomam os critérios que definem as mídias, afirma Bernard Miège
Por: Thamiris Magalhães | Tradução Benno Dischinger
“A transnacionalização está precisamente sob o empreendimento de poderosos grupos de comunicação, primeiramente daqueles formados a partir das indústrias de materiais e de vetores lógicos da informática, bem como de redes de comunicação, em seguida das indústrias de conteúdos, culturais e informacionais. São esses grupos que são o motor da transnacionalização”, define o professor da Universidade de Grenoble, Bernard Miège, em entrevista concedida por e-mail à IHU On-Line. Para ele, as tecnologias da informação e comunicação fazem parte da construção do social, “mas isso não me parece ser sua função primária, longe disso; elas contribuem primeiramente à gestão das mediações em todos os campos sociais, sob o mesmo título que a mídia existente e as estratégias de comunicação das organizações”.
Bernard Miège é professor da Universidade de Grenoble, na França. É um pensador dedicado a questões que envolvem o espaço da comunicação nas complexas sociedades contemporâneas. É autor de várias obras, dentre as quais estão publicadas em português O pensamento comunicacional (Petrópolis: Vozes, 2000) e A sociedade tecida pela comunicação: técnicas da informação e da comunicação entre inovação e enraizamento social (São Paulo: Paulus, 2009).
Bernard Miège esteve na Unisinos onde participou do seminário “Fundamentos sociais das tecnologias de informação e comunicação”, promovido pelo Programa de Pós-graduação em Ciências da Comunicação.
Confira a entrevista.
IHU On-Line – O senhor crê que esses dispositivos tecnológicos tomarão o lugar dos meios de comunicação de massa que ainda são disponíveis ou as mídias digitais são uma continuidade das Tecnologias da Informação e Comunicação?
Bernard Miège – As Tecnologias da Informação e Comunicação – TIC em seu conjunto e, entre elas, aquelas que formam verdadeiramente novos meios, e não somente técnicas de comunicação (isto é, de relacionamentos e de trocas entre os indivíduos), não são chamadas a tomar o lugar dos meios que se implantaram ao longo dos últimos 150 anos. Mas, seja qual for sua importância, no futuro ainda pouco previsível (novos dispositivos podem emergir), as TIC e os meios numéricos juntar-se-ão e coordenar-se-ão com os meios existentes, segundo modalidades que dependerão, sobretudo, de estratégias dos (poderosos) grupos de comunicação transnacionais.
IHU On-Line – Como define o conceito de transnacionalização da comunicação?
Bernard Miège – A transnacionalização está precisamente sob o empreendimento de poderosos grupos de comunicação, primeiramente daqueles formados a partir das indústrias de materiais e de vetores lógicos da informática, bem como de redes de comunicação, em seguida das indústrias de conteúdos, culturais e informacionais. São esses grupos que são o motor da transnacionalização.
IHU On-Line – Por que diz que não se pode separar a comunicação midiatizada da não midiatizada? Quais são as características de cada uma delas? De que forma se pode inseri-las em sua teoria da continuidade?
Bernard Miège – A comunicação se midiatiza, isto é, essencialmente a comunicação intercorporal e linguística está presente nas trocas à distância, numeradas e ubiquitárias que nós consideramos como elementos da comunicação midiatizada. Quer queiramos ou não, não se pode fazer abstração destas modalidades de comunicação que se formaram e forjaram após aproximadamente cinco milênios, isso até seria dramático e “patológico” caso se conseguisse fazê-lo. Mas estes são discursos “tecnodeterminados” de promoção das novas TIC que nos incitam a crer que entramos numa comunicação inteiramente diferente, e jamais experimentada. Porém, bem entendido, isso não impede que se experimentem novas formas e que novas modalidades apareçam.
IHU On-Line – De que maneira as Tecnologias da Informação e Comunicação têm um papel central na construção social?
Bernard Miège – Na verdade, isso não é minha preocupação primária, nem mesmo um interesse afirmado, pois eu não sou sociólogo das interações sociais, mais especializadas da informação/comunicação. Além disso, eu atribuo tanta importância às dimensões macro- e meso- como micro-. Concebo que se possa considerar que as TIC fazem parte da construção do social, mas isso não me parece ser sua função primária, longe disso; elas contribuem primeiramente à gestão das mediações em todos os campos sociais, sob o mesmo título que a mídia existente e as estratégias de comunicação das organizações.
IHU On-Line – Qual é a diferença entre os usos e as práticas sociais comunicacionais?
Bernard Miège – Os usos são as utilizações encontradas das TIC; elas são qualificadas de sociais porque são comuns a diversos indivíduos, formando categorias de usos. Elas se constatam no tempo curto e correspondem a cada TIC, ou pelo menos a cada dispositivo. Elas devem ser distinguidas das práticas sociais, de informação e de cultura que, elas mesmas, não estão limitadas às TIC, mas são, sobretudo, relativamente duradouras e devem ser inscritas no tempo longo; elas se modificam, mas dependem dos habitus culturais e variam em função das determinações sociais e culturais próprias a determinadas classes de indivíduos. As práticas (por exemplo: a prática cotidiana de informação, a prática cinematográfica ou a prática de audição musical) são mutlissuportes e multitécnicas, e elas integram progressivamente os usos que produzem as mutações.
IHU On-Line – Qual é a definição da palavra “mídia” e de que maneira ela é associada às Tecnologias da Informação e Comunicação?
Bernard Miège – Como eu o indiquei por ocasião do seminário, as mídias “históricas”, ainda atuais, podem ser definidas a partir de cinco a sete critérios que são outros tantos componentes. As mídias digitais não retomam todos esses critérios, e particularmente aquele da programação. Quanto às técnicas de comunicação saídas elas também das TIC (por exemplo, o telefone ou o correio eletrônico), estas não retomam esses critérios que definem as mídias; isso porque é um erro ver em todas as TIC novas mídias.
IHU On-Line – Qual é a diferença entre informação e comunicação?
Bernard Miège – As significações de Informação e de Comunicação que circulam são múltiplas; há termos plurissemânticos cujo significado é intrincado e confuso. Mas, para ir ao essencial, deve-se reter que a informação represente o conteúdo que é difundido através dos canais e utensílios de comunicação. Isso é assim desde a civilização sumérica, e os primeiros tábletes de argila reproduziam textos administrativos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário