terça-feira, 17 de abril de 2012

Sony: como uma gigante cai


‘Talvez a Sony mude. Vai ser bem difícil’

Na última quinta-feira, o novo presidente da Sony, Kazuo Hirai, abriu o sorriso perante um grupo de jornalistas em Tóquio para anunciar o slogan que, promete, marcará sua gestão. “A Sony vai mudar.” Aproveitou para dizer também que, até o fim do ano, dez mil funcionários perderão seus empregos. Representam 6% da equipe. E que o prejuízo em 2011 foi de US$ 6,4 bilhões. Há 20 anos, seria impossível escrever uma coluna sobre alta tecnologia sem mencionar empresas japonesas a toda hora. Hoje, entre o Vale do Silício, a China e a Coreia do Sul, o Japão é só nota de pé de página.
Se há um produto que melhor simboliza a marca Sony, são suas TVs. Os aparelhos ainda têm o melhor tom de preto do mercado. Veja um filme na sala escura e o negro da noite numa cena se dissipa no negro da sala. Em qualquer outro aparelho, o preto traz um tom sujo, de cinza escuro com algum brilho emitido. Mas é só ir ao site oficial da Sony que o consumidor, coitado, logo se perde. Qual TV comprar? Um modelo da série BX325, talvez? Ou BX425. Ou CX525. Ou EX525. São nove modelos diferentes, cada qual com toda a gama de tamanhos de telas. Não é só o comprador que se confunde. Nas lojas, vendedores têm dificuldades de explicar as diferenças entre uma e outra. Mesmo quem tem o bolso forrado e quiser comprar um modelo com a melhor tecnologia que a Sony pode oferecer não encontra. Nenhum modelo tem todos os recursos oferecidos.
(Por questão de justiça: as TVs Sony ganham na qualidade de cor mas o movimento é mais fluido nas da Samsung. Para filmes de ação, há quem prefira. No tempo do tubo de imagem, a Sony tinha uma qualidade muito superior à da concorrência. As diferenças, hoje, são mais sutis.)
A Apple tem dois modelos de iPhone, o 4 e o 4S. Eles vêm em duas cores. Tem dois modelos de iPad: o 2 e o novo, HD. O consumidor só decide quanto espaço de memória quer. Google e Facebook têm a mesma obsessão por simplicidade em seus sites. Esta é uma diferença entre o Vale do Silício e a Sony.
O outro símbolo há muito perdido da Sony é o Walkman. Quem viveu, lembra. Aquele toca-fitas portátil com fones de ouvido foi, há um tempo, o símbolo máximo do sujeito afinado com seu tempo. Mais moderno ou jovem, impossível. Não faz tanto tempo assim. Até a virada do século, som portátil e Sony ainda eram sinônimos. Não passou do simpático Discman, para CDs. (Não era lá muito confiável numa corrida, o balanço fazia o disco saltar.) Ela nunca alcançou o MP3.
É simples entender o motivo. A Sony não é apenas uma empresa de tecnologia. É também um estúdio de cinema e uma gravadora, ambas de grande porte. A empresa sofreu no tempo do videocassete. Preocupada com a pirataria, antes de descobrir o negócio da venda de filmes, Hollywood tornou difícil a vida de quem queria vender reprodutores de vídeo. Foi neste momento dos anos 1980 que a Sony decidiu, estrategicamente, entrar no ramo da produção de conteúdo.
Um negócio não é, aparentemente, compatível com o outro. O método de gerência que move o Vale é o da destruição criativa. Vez por outra, é preciso apagar o passado para escrever o próximo capítulo. Numa grande corporação hierarquizada à moda japonesa, não funciona. Quando foi produzir um player digital para entrar na briga do iPod, a primeira preocupação da Sony foi a de preservar os direitos autorais de sua gravadora. É uma preocupação de todo legítima. Os consumidores, porém, queriam algo que fosse prático. Do modelo Apple, saiu um estupendo negócio de venda de música legal. Mas foi preciso, antes, desmontar tudo. A Sony não desmontou nada. Começará agora?
A Sony teve uma última dificuldade. Complicou sua linha de produtos, permitiu que o modelo de negócios de uma subsidiária bloqueasse o desenvolvimento de outra e fez mal a transição para o digital. Há um truque, aí: no mundo analógico, o hardware é tudo. No digital, um bom software salva o mau hardware mas o contrário não é verdade. É o caso da Nokia. Seus celulares são máquinas excepcionais. Compare com um Android e fica óbvio como são difíceis de usar. A parceria com a Microsoft veio a calhar para a Nokia. Comparados com os equipamentos digitais de hoje, as máquinas Sony são difíceis de usar e se integram mal umas com as outras.
Talvez a Sony mude. Vai ser bem difícil.

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