Snowden sugere que empresas de tecnologia não foram sinceras ao explicar pedidos de acesso do governo a contas de usuários
COM AGÊNCIAS INTERNACIONAIS
PEQUIM - A China cobrou pela primeira vez explicações dos Estados Unidos sobre programas de vigilância secretos da Agência de Segurança Nacional (NSA) que rastreiam dados telefônicos e de internet de milhões de cidadãos americanos e estrangeiros. O porta-voz do Ministério das Relações Exteriores, Hua Chunying, exigiu nesta segunda-feira que Washington dê atenção às preocupações da comunidade internacional. Enquanto isso, o americano responsável pelo vazamento da espionagem, Edward Snowden, voltou a alfinetar o governo dos EUA dizendo que foi motivado pela decepção com o governo de Barack Obama e que não teria um julgamento justo caso fosse extraditado para seu país. Ele sugere ainda que as empresas de tecnologia não deram respostas sinceras ao explicarem o acesso do governo a dados de usuários.
Até agora, o governo chinês não havia comentado diretamente o caso, limitando-se a repetir sua posição habitual de que a China é um dos países mais vitimados por ciberataques. No domingo, o jornal britânico “The Guardian” informou que a prática de espionagem não se restringe ao governo americano, revelando que o Reino Unido monitorou funcionários e delegados de países do G-20 em 2009.
- Acreditamos que os Estados Unidos devem prestar atenção às preocupações e demandas da comunidade internacional e dar à comunidade internacional a explicação necessária - afirmou Chunying.
Uma fonte ligada à liderança do Partido Comunista disse que a China optou pelo silêncio porque não quis ameaçar a recente melhora nas suas relações com o Ocidente. Autoridades na Alemanha e de outros países já haviam pressionado os EUA a fornecer mais detalhes sobre os programas ultrassecretos do governo. O sistema de espionagem foi revelado pelo ex-técnico da CIA Edward Snowden que, antes de entregar documentos secretos do governo americano aos jornais “The Guardian” e “Washington Post”, voou para Hong Kong, onde tem seu paradeiro desconhecido.
Também a partir de vazamentos de Snowden, o diário britânico informou que o Reino Unido interceptou ligações telefônicas e monitorou computadores utilizados por participantes de duas reuniões financeiras internacionais de alto nível do G-20 em Londres, em 2009. Além disso, Snowden informou na semana passada ao jornal “South China Morning Post”, o principal jornal de língua inglesa de Hong Kong, que os americanos tinham espionado computadores de civis na China e em Hong Kong.
A Rússia e a Turquia reagiram com revolta às novas denúncias e pediram explicações ao Reino Unido após as revelações de que políticos e funcionários foram espionados durante o encontro do G-20. Em Moscou, autoridades russas disseram que a revelação do diário britânico iria prejudicar ainda mais as relações entre EUA e Rússia e lançar uma sombra sobre a cúpula do G-8 na Irlanda do Norte, realizada nesta segunda e terça-feira.
Snowden diz que não teria julgamento justo nos EUA
Num fórum online com leitores do jornal “Guardian”, o ex-técnico da CIA Edward Snowden disse que não teria chances de ser julgado de forma justa nos EUA. Segundo ele, sua intenção ao divulgar a espionagem era proteger civis, e não ameaçar operações legítimas do serviço de inteligência. Snowden assegurou que o governo dos EUA já o considera culpado e que seria condenado por traição e outras ações imperdoáveis.
“O governo dos EUA, assim como fez com outros que vazaram informações sigilosas, imediatamente destrói qualquer possibilidade de um julgamento justo em casa, declarando abertamente que sou culpado de traição, de divulgação de segredos e de atos inconstitucionais imperdoáveis. Isso não é justiça”, escreveu no site do “Guardian”. “Eu não revelei operações da CIA contra legítimos alvos militares. Eu apontei onde a NSA invadiu sistemas civis como universidades, hospitais e negócios privados porque isso é perigoso”, se defendeu.
Perguntado se acreditava que Google e Facebook não estivessem a par do programa Prism, Snowden respondeu:
“Suas negações passaram por várias revisões, deixando cada vez mais claro que estavam enganando, e incluíram linguagem idêntica e específica. Elas são obrigadas a manter silêncio sobre detalhes do programa, mas isso não as isenta da obrigação moral. Se, por exemplo, Facebook, Google, Microsoft e Apple se recusassem a cooperar com a comunidade de inteligência, o que o governo faria? As fecharia?”
Quando questionado sobre suspeitas de que ele teria revelado dados da inteligência dos EUA para o serviço secreto chinês, Snowden brincou, dizendo que isso era uma forma de o governo americano desviar a atenção das denúncias: “Se eu fosse um espião chinês, porque eu não fugi diretamente para Pequim? Eu estaria vivendo em um palácio e tendo uma fênix como bicho de estimação.”
a conversa com os internautas durou duas horas, e foi feita a partir de um ponto não revelado de Hong Kong. Snowden não respondeu diretamente se ainda tem mais material não revelado, mas disse que agora era impossível deter a verdade.
“Tudo o que posso dizer agora é que o governo americano não será capaz de encobrir isso me prendendo ou me assassinando. A verdade está chegando e ela não pode ser detida.”
O autor dos vazamentos viajou para Hong Kong, uma região autônoma chinesa, em 20 de maio e acredita-se que ainda esteja lá. A China não fez nenhuma declaração sobre a possibilidade de deportá-lo, enquanto autoridades americanas pressionam os EUA a pedirem sua extradição.
Um editorial do jornal “Global Times” defendeu nesta segunda-feira que extraditar Snowden representaria uma “perda de autoridade”, tanto para Hong Kong quanto para Pequim.
“As consequências de extraditar Snowden para os Estados Unidos seriam mais problemáticas, porque a reação local traria mais conflito para Hong Kong e para a China continental”, diz o texto, que ressalta que o americano não fez mal a ninguém.
Segundo o diário, o “único crime” de Snowden foi revelar a violação do governo dos EUA aos direitos civis, uma ação que, segundo o jornal, tem sido aplaudida por todo o mundo. Os EUA têm defendido os programas de vigilância como essenciais para o controle e a prevenção de ataques terroristas.
Nenhum comentário:
Postar um comentário