segunda-feira, 17 de junho de 2013

Entrevista do ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, ao TeleSíntese

*Entrevista realizada pelas jornalistas Lia Ribeiro Dias e Miriam Aquino, do portal TeleSíntese. Publicada em 17 de junho de 2013. Clique aqui para ler no site original.

 Ministro(Foto: Herivelto Batista)
O ministro das Comunicações, Paulo Bernardo, não vê o ingresso do português Zeinal Bava na Oi como um indício de desnacionalização da operadora brasileira, como avalia o mercado. Para ele, um plano de captação que dê mais recursos para a operadora é bem-vindo. Ressalta que o BNDESpar e os fundos de pensão das estatais vão continuar no controle.
Nesta entrevista, Paulo Bernardo fala também da possibilidade de contar as concessionárias de energia elétrica para apoiarem a segunda etapa do Plano Nacional de Banda larga, que está em discussão no governo e pretende levar a velocidade rápida da internet para mais de 90% dos lares brasileiros em 10 anos. Fala também de sua preocupação com a quebra do sigilo da internet, do Marco Civil e da ampliação do serviço celular para os distritos municipais.


Tele.Síntese – Ministro, a maioria dos bancos analisa que a vinda de Zeinal Bava para a Oi é mais um passo na direção de a Portugal Telecom ou comprar a operadora nacional ou promover uma fusão de ativos. Nos dois casos, há um componente político, visto que o governo do PT se movimentou para criar a super tele nacional, e neste caso, ela ficaria desnacionalizada. Como o sr. vê esta questão?
Paulo Bernardo – Fomos informados que esta mudança não é apenas mudar o presidente. Há sim um plano de captação de recursos. E nós respondemos a eles que não temos óbices. Não nos compete dizer “faça” ou “não faça”.
Tele.Síntese – O governo não tem preocupação de perder o controle nacional?
Bernardo – Não, porque o BNDESPAR e os fundos vão manter a sua participação, não sei se vão aumentar, mas vão mantê-las.
Tele.Síntese – A dúvida: não há uma posição de governo de querer manter sócios brasileiros no controle da Oi?
Bernardo – Não discutimos isso. Os sócios privados não nos falaram nada sobre qualquer intenção de sua parte. Assim, não há o que discutir.
Tele.Síntese – Como o sr. vê esta proposta de reestruturação da Oi?
Bernardo – Entendo que a Oi precisa de injeção de recursos e precisa acelerar a adoção de uma agenda de inovação. A Portugal Telecom, embora seja uma empresa menor que a Oi, inegavelmente tem uma bagagem inovadora. Puseram fibra no país inteiro, tem tecnologia e gestão. E precisam de recursos. Se conseguirem alavancar recursos é importante. Sem querer me meter na discussão interna da saída do Valim ou não, mas também acho que precisa ter mais investimento. Do nosso ponto de vista, se caminhar neste sentido, vamos ajudar e apoiar.

Tele.Síntese – Ministro, o que o governo brasileiro está fazendo em relação à recentes denúncias de que o governo norte-americano está monitorando as contas de “não residentes?”
Bernardo – Uma coisa é a vida interna nos Estados Unidos, não temos nada com isto. O governo brasileiro não vai se meter, sabemos o zelo que os americanos têm com a segurança. Mas cada vez está se confirmando que essas informações afetam cidadãos do mundo inteiro. Acho particularmente grave a concentração da internet muito pesada nessas empresas e também o fato de as notícias afirmarem que essas empresas estavam colaborando com o governo, chegando a mudar os seus sistemas corporativos. Teve um funcionário que afirmou que “nós não estamos monitorando os americanos”. Só os outros seis bilhões de pessoas.
Tele.Sintese – Ministro, isto não levanta também a questão do PTT?
Bernardo – Liguei, quando as notícias começaram a ser publicadas, para o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo. Acho que não temos que discutir a situação dos Estados Unidos. Isto não é na nossa conta. Mas a situação do Brasil. O que está acontecendo lá mostra que temos carência de políticas mais consolidadas a respeito da internet. Por exemplo: o Google foi condenado em um processo de lavagem de dinheiro e disse que não entregaria os dados, alegando que seu data center está nos Estados Unidos, e teria que obedecer à lei norte-americana. Ora, é evidente que o STJ não podia concordar com isto e a ministra Laurita Vaz deu parecer que a empresa atua no Brasil e tem que obedecer às leis brasileiras. Não queremos e-mails de cidadãos americanos.
Tele.Síntese – Como o sr. acha que pode ser resolvida esta questão?
Bernardo – Acho que no mínimo devemos ter de cópia de guarda dos dados brasileiros em solo brasileiro. Não posso exigir que eles não guardem lá, mas posso exigir que tenham um espelho no Brasil. Pode guarda em Saturno ou na Lua, mas se a gente precisar, tem que fornecer. Há outras questões, como o projeto que trata da segurança de dados pessoais, onde a coordenação é do ministério da Justiça. A guarda de dados combina com este projeto e com o Marco Civil. O Marco Civil permite que as empresas “Over the Top” guardem as informações, mas não especifica onde. Acho que precisamos definir que deve ser guardado no território brasileiro.
Tele.Síntese – O sr. acha que esse movimento afeta o conceito do Marco Civil?
Bernardo – Acho que não. Nós somos a favor na neutralidade da rede e de guardar o dados aqui. O que não pode é alegar que está guardado em outro lugar e por isto não pode se submeter à lei brasileira. Há notícias de que o Google já é o segundo maior recebedor de publicidade no Brasil, só perde para a Globo. Como não tem nada a ver com o Brasil?
Outra questão que podemos discutir, é a do Direito Autoral. Precisamos ver também o direito do consumidor. Primeiro, precisamos estabelecer os direitos do cidadão. Depois ver o direito do consumidor.

Tele.Síntese – E como estão as discussões para se ter um PTT (Ponto de troca de tráfego) aqui?

Bernardo – Esta é uma questão importante. Conversei com o presidente do CGI, e ele já acha que precisamos ter mesmo é um servidor raiz. Para ele, só o PTT não vai resolver. Quando falei em Dubai ( na reunião da UIT ), e defendemos a governança multilateral para a internet. Não dá para achar que ela deve ficar deste jeito.
Tele.Síntese – Mas o sr. acha que o fórum é a UIT, devido à última reunião de Dubai, onde houve muita divergência?
Bernardo – Acho que a UIT tem seu papel, mas não é realista pensar que a Internet não deveria ficar no Icann. O Icann precisa de uma nova forma de trabalhar. Ele é submetido à lei da Califórnia, nem à legislação americana é. Isso precisa mudar.
Tele.Síntese – Ministro, conforme o Sr. observou, o Google já é o segundo maior captador de anúncio no Brasil. Diferentes governos na Europa estão agindo para evitar a evasão de divisas de empresas como a dele. Aqui, isto não preocupa o governo?

Bernardo – Embora isto não seja um tema do ministério das Comunicações, esta questão me preocupa. A empresa paga ISS, que está afeto aos municípios. Mas posso falar com meu colega da Fazenda para ver como está o seu recolhimento sobre o lucro, por exemplo.
Tele.Síntese – A Espanha fez um vasto levantamento do faturamento do Google em seu país e na Irlanda, e constatou que ele faturou muito mais na Irlanda, com produtos espanhóis. Os países perdem receita grande.

Bernardo – O senado dos Estados Unidos questionaram também o seu planejamento tributário. Na França, acusaram o Google de estar fazendo “duplo irlandês invertido”. Ou seja, não pagava o nosso INSS e também não apurava lucro, e não pagava Imposto de Renda. Isso não é do MiniCom, mas o governo está olhando.
Tele.Síntese – As empresas estão agora na nuvem, e isto se tornou uma preocupação de todo o mundo.

Bernardo – Mas o dinheiro não vai para a nuvem, ele passa por uma conta. E é isto que precisamos ver. Lá em Dubai, o Google soltou um documento muito virulento. Acusando a nós e aqueles que assinaram o tratado da Conferência de estarmos no “eixo do mal”. E agora descubro que eles e as demais empresas estão com uma relação de quase “anexo” do governo. Eles precisam dar algumas explicações. É surpreende que as pessoas não estão falando nada neste episódio.

Tele.Síntese – A antecipação das metas da telefonia rural está meio confusa. Em que pé que está isto, ministro?

Paulo Bernardo - Com o leilão da 4G e a inclusão das frequências de 450 MHz, as empresas têm obrigação contratada de oferecer internet na área rural em 2014 e 2015. Nós aventamos a possibilidade de encurtar o calendário. Evidentemente, se tiver comprovadamente algum custo, teremos que discutir. Para fazer o que eles têm obrigação, é claro que nós não vamos dar nada. E também não pode ser um custo muito alto. Até porque elas têm obrigação de fazer 60% da cobertura no próximo ano, sendo que 30% até junho de 2014, 30% em dezembro e os 40% restantes em 2015. Podemos antecipar um pouco, ou então deixar do jeito que está, já que a maior parte vai ser feito no próximo ano.
Mas o que estamos negociando é a grande demanda que existe por telefonia móvel nos distritos. Como isto nunca foi colocado em edital da Anatel, nós podemos colocar esta obrigação no edital de venda da faixa de 700 MHz.

Tele.Síntese – O sr desistiu de conseguir esta medida por parte das operadoras privadas?
Bernardo – Não. Conversei com a presidenta Dilma e ela lembrou das restrições fiscais. Se ficar em um custo aceitável é possível, mas terei que conversar com a Fazenda. Mas acho que se não der para fazer com todo o setor, poderemos seguir o modelo do Espírito Santo.
Tele.Síntese – Leilão reverso?

Bernardo – Arranjo um imobilizado de recursos e faço uma concorrência este ano. Mas tudo tem que ficar resolvido este ano, se não, não adianta nada. Mesmo que o percentual não seja muito diferente – de 60% de cobertura, a gente consiga antecipar para 70, 75%, o importante é que o cidadão foi atendido mais cedo.
Tele.Síntese – Mas porque iria encarecer o projeto, se é só antecipação de metas, no caso da cobertura rural, sem o celular?
Bernardo – Exatamente isto que eu falei aos empresários. Se tiver algum custo extra decorrente desta antecipação, o governo pode ajudar com alguma desoneração. Agora, custo alto não é possível.
Tele.Síntese – Mas o celular no distrito deve ser mais caro, não?

Bernardo – Sim, este, com certeza tem um custo. Mas neste caso podemos modular, onde tivermos pernas para ir, podemos ir. No restante, vamos colocar obrigação no edital da 700 MHz.

Tele.Síntese – E o novo PNBL. Sai?
Bernardo – Temos dois problemas: o primeiro é a restrição fiscal. Como é um plano para 10 anos, é possível equacionar. O outro problema é a questão dos empréstimos, porque as teles parecem não ter capacidade de maior endividamento. E não estou falando só da OI, não, mas de todas. Então, podemos pensar em outras empresas, como por exemplo, as elétricas. É um assunto para ser olhado.

Tele.Síntese – Como está o compartilhamento com as elétricas?
Bernardo – Falei com a presidente e ela falou que vai mandar fazer. Vai ter que chamar todo mundo. Vamos ter que fazer o meio termo para deixar todo mundo confortável. Terei que convencer o ministério das Minas Energia. Mas tem que ser uma reunião chamada pela Casa Civil. Alguém vai ter que arbitrar. O Transporte concorda com tudo, mas quando digo que não ele vai cobrar nada pelos cabos de telecom, aí ele não topa.

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