LONDRES - Em 1999, ainda um adolescente de boné, Sean Parker, futuro investidor bilionário do Facebook, disse a jornalistas que um dia “todo mundo vai ouvir música no celular”. Era mais ou menos, lembra ele, como “tentar vender eletricidade para as pessoas antes da invenção da lâmpada elétrica”.
“Downloaded”, filme que conta a história do serviço de compartilhamento digital de música Napster, está cheio de momentos assim, em que os fundadores da companhia, Parker e Shawn Fanning, já vislumbram um futuro no qual os fãs ouvem música em aparelhos diversos, mesmo enquanto todo mundo está indo à Virgin Megastore para comprar o disco das Spice Girls.
O documentário de duas horas teve sua première mundial no festival South by Southwest, encerrado no último domingo, no Texas, com a presença dos dois fundadores do Napster e do diretor do filme, Alex Winter. O cineasta de 47 anos ainda é mais conhecido pelo papel de Bill S. Preston, que desempenhou nas comédias “Bill e Ted — Uma aventura fantástica”, de 1989, e “Bill e Ted — Dois loucos no tempo”, de 1991, além do Marko de “Os garotos perdidos” (1987) e de codirigir e estrelar “Freaklândia — Parque dos horrores” em 1993. Desde então, ele pouco fez além de dirigir séries de TV. Esta versão da história do Napster tem algo de Bill e Ted, dois adolescentes que acabam, involuntariamente, mudando a História.
Parker e Fanning, de Virgínia e Massachusetts, respectivamente, se conheceram em uma sala de chat na internet, nos anos 1990. Com 17 e 18 anos, foram para a Califórnia para fundar o Napster, uma comunidade digital de compartilhamento gratuito de música.
— Éramos meninos, nunca tínhamos andado de avião — lembra Fanning. — De repente, nossos ídolos pareciam querer nos matar.
26 milhões de usuários em dois anos
Quinze anos depois, percebe-se como o Napster era audacioso: em dois anos de operação, ele chegou a 26 milhões de usuários, deixou de joelhos a indústria musical, que valia US$ 50 bilhões e mudou a percepção dos fãs, que passaram a pensar se gostariam de pagar ou não por suas coleções de discos. No filme, as gravadoras lembram como ficaram em “emboscadas” armadas pelos garotos; elas os chamavam de ladrões, piratas, mercenários. Se o público acreditar em Parker e Fanning, eles eram apenas adolescentes em um pequeno escritório no Vale do Silício que não tinham a menor intenção de rearrumar a indústria musical; mas se não fossem eles, outra pessoa faria isso.
— Em 1998, já havia tecnologia para uma loja do iTunes ou para um serviço de streaming — diz Parker. — As gravadoras sabiam disso, mas a atitude delas era: “Como podemos bloquear isso, ou como faremos para garantir que ninguém nunca vai roubar uma faixa de nós?”. Eles estavam apavorados. Nós apenas preenchemos uma lacuna que as gravadoras tiveram a chance de ocupar, mas se recusaram. Eles perderam a indústria inteira por isso.
O Napster acabou em 2001, depois de enfrentar processos de companhias e dos artistas — Metallica e Dr. Dre foram os mais badalados. Mas suas ideias não morreriam. Sean Parker levou suas noções de comunidade e streaming de música em suas empreitadas seguintes, o Facebook e o Spotify. O Napster iniciou um movimento que levaria à queda dos pilares da velha indústria fonográfica na década seguinte.
A empolgação da época é palpável no documentário, que retrata o surgimento do movimento música-de-graça-para-todos. Parker lembra a “época de ouro para a música. Eu nunca vi tanta paixão na descoberta de artistas como naquele ano, 1999”.
Alex Winter diz que fez o filme por ser “fã do Napster”. Fatos como o Wikileaks o incentivaram, já que “uma década depois do Napster, pouco mudou em relação à desconfiança geral que se tem do compartilhamento de informação on-line. Eu quis colocar a história deles nesse contexto”.
O que ele fez, no entanto, foi capturar um pouco da energia e da alegria daquele tempo — uma lembrança de como, recentemente, jovens ousados comandaram uma revolução cultural.
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