Uma análise sobre a cartilha - e as eventuais concessões - que bandas e artistas independentes seguem para atingir o sucesso
Por Bruno Natal
Até que o inimaginável aconteceu. Com as mudanças trazidas pelo compartilhamento digital, uma banda com todas as credenciais indie dos anos 2k, como o Vampire Weekend (se não ao som, no que diz respeito aos métodos de trabalho), chegou com seu segundo disco, “Contra”, ao topo da mais comercial das paradas, a Billboard. Estava então consolidada uma nova dinâmica comercial. Uma banda “de internet” podia furar a bolha e conquistar o grande mercado.
Na pressa de entrar na nova ciranda que se formou, cada vez mais autores lançam mais projetos, mais rápido, com mais pressa, sem deixar o necessário tempo de maturação acontecer. Em tempos de vida em beta e ao vivo, as bandas se formam na frente do público. O óbvio lado positivo dessa escalada indie veio acompanhado de aspectos negativos. Aberta a nova corrida do ouro, com a velocidade típica da rede, bandas e mais bandas começaram a se moldar, tentando seguir um (nem tão) imaginário livro de regras para se dar bem no cenário atual.
Máquinas de divulgação
Como escreveu Carles no blog Hipster Runoff, dos EUA, no recente artigo “Como o indie finalmente oficialmente morreu: a máquina indie quebrada”, o velho sistema foi substituído por um novo, igualmente sufocante, ainda que menos poderoso. Em vez da benção de gravadoras e rádios, para sobreviver nesse ecossistema artistas precisam passar por determinados sites e blogues — uma lista específica deles — e/ou participar de ações publicitárias.
Na busca desesperada por não ficar atrás dos concorrentes (seja lá o que isso queira dizer), esses veículos on-line perdem sua característica definidora — o papel de filtrar informações, preferencialmente com personalidade —, e comem de colher tudo o que é oferecido por bem estruturadas máquinas de divulgação disfarçadas de assessorias de imprensa. O resultado é uma série de sites repetindo o mesmo conteúdo, assemelhando-se à cobertura da grande imprensa no que tem de pior. E, assim, listas de melhores do ano saem praticamente idênticas, mundo afora, como se fossem um teste de múltipla escolha, com respostas certas e erradas, e não seleções independentes e pessoais do que se ouvir num catálogo cada vez mais vasto.
Para chegar ao mágico momento em que finalmente, muitas vezes até por mérito próprio, conseguem estar em todas as páginas “importantes”, muitas bandas passam a ser o que delas se espera, gerando sons genéricos de algo que está na moda ou parece certo para aquele momento. Tudo para depois descobrir que, passado o seu momento, sua banda nada mais foi do que alimento para o ciclo do dia, da semana — com sorte, do mês. A roda gira, dando lugar ao próximo a ser esmagado pelo mesmo processo.
Se isso gera muita frustração em bandas que esperam fazer daquilo seu ganha-pão, a falta de perspectiva financeira é extremamente libertadora para outros artistas. Num mercado em que até mesmo um indie bem estabelecido como Grizzly Bear (tocando no Radio City Music Hall, em NY, com discos no top 10) afirma em reportagem da “New York Mag”que as contas não fecham, cada vez mais se vê bandas, mesmo conhecidas, serem um hobby bem estruturado de profissionais de outras áreas, com consequências boas e ruins.
É natural que muitos desses comportamentos vistos nos EUA, o mercado mais estabelecido, se repitam no Brasil. Por aqui, pra piorar, existe uma espécie de código não escrito na cena alternativa de que não se pode criticar negativamente um músico, simplesmente pelo fato de ele já “ralar muito pra fazer aquele trabalho acontecer”. Como se isso fosse justificativa e não exatamente parte do problema.
Como disse o amigo Raymond S. Harmon no Facebook, “no exato segundo que o pensamento ‘a música de hoje não presta’ cruza sua mente você está oficialmente velho, não precisa nem que se diga isso em voz alta”. O autor do texto do Hipster Runoff foi acusado justamente disso (embora não fique clara sua idade). Pode ser. A principal crítica aqui, no entanto, é quanto ao formato operacional de parte da indústria, este sim culpado pela baixa qualidade do conteúdo.
Ainda encontra-se muita, muita música boa, nova, todo dia. Mesmo que várias delas sejam feitas para o agora, sem maiores preocupações. E quem pode dizer que isso é ruim? No fim, as decisões cabem a quem ouve (ou lê), e é ótimo que seja assim
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